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Líderes negros são menos de 30% nas empresas brasileiras,diz pesquisa

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Pretos e pardos ainda estão mais na base do que no topo da pirâmide da hierarquia corporativa. Chefes afro-brasileiros de diversos setores fazem a diferença no mercado de trabalho ao se tornarem referências para profissionais mais jovens – (crédito: Arquivo Pessoal)

Nas empresas brasileiras, menos de 30% dos cargos de liderança são ocupados por pessoas negras. O percentual é baixo e ainda sofreu queda. Em 2018, a população preta ou parda ocupava 29,9% dos cargos gerenciais. Em 2019, esse índice caiu para 29,5%, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Enquanto mulheres brancas correspondiam a 66,9% dos cargos gerenciais, a parcela de negras nessas posições é de 31%. A diferença entre homens brancos (69,3%) e negros (28,6%) em postos de liderança é maior. Nas grandes corporações, a proporção é ainda mais desigual.

Os negros representam 55,9% da população brasileira, mas ocupam apenas 4,7% dos cargos de liderança nas 500 maiores empresas do país, segundo pesquisa do Instituto Ethos. As mulheres negras representam 9,3% dos quadros destas companhias e estão presentes apenas em 0,4% dos altos cargos.

“Quando falamos de racismo estrutural, estamos falando de um sistema de hierarquização de grupos que coloca a população branca no topo do poder”, diz Aline Nascimento, analista sênior de treinamentos e ações afirmativas do Instituto Identidades do Brasil (ID-BR).

Para que essa estrutura se rompa, é preciso que as ações afirmativas para o mercado de trabalho estejam presentes em todos os níveis de vagas. “É necessário pensar a proporcionalidade em todos os níveis hierárquicos. Enquanto não tivermos profissionais negros em cargos de liderança, não conseguiremos fazer com que essas ações ganhem, de fato, uma proporção de longevidade”, afirma.

Trocas

Programas de mentoria e aceleração de carreira podem ajudar e, inclusive, os próprios líderes do presente têm um papel nos rumos das posições de chefia. Para Aline, a pergunta a se fazer é: “o que você está fazendo para que o seu sucessor seja uma pessoa negra?”

Cris Kerr, CEO da consultoria CKZ Diversidade, relata que, em programas de mentoria, é comum ter homens brancos orientando negros, uma vez que eles são maioria nos cargos de gestão. “Essa troca é fundamental não só pela mentoria em si, mas porque esse mentor vai conhecer esse profissional negro e poderá advogar em favor dele para futuras promoções.”

A inclusão verdadeira exige inserir pessoas de todos os perfis em todas as posições hierárquicas e não apenas garantir que entrem na empresa. As funções de liderança não estão tradicionalmente entre aquelas para as quais as organizações brasileiras promovem ações afirmativas.

“Por isso, o trainee exclusivo para negros do Magazine Luiza foi disruptivo: é porque o trainee é preparado para assumir funções de gestão”, comenta Cris. Iniciativas que ajudem a colocar mais negros no topo são importantes até pela representatividade.

“Disseram para mim uma vez: eu me sinto um pontinho negro num oceano branco. E é verdade. Se, na liderança, só se vê pessoas brancas, funcionários pretos e pardos pensarão que não chegarão lá”, afirma.


Base x topo

Levantamento do site de recrutamento Vagas.com com pessoas cadastradas na plataforma revela que a quantidade de pretos e pardos diminui à medida que se sobe na pirâmide hierárquica: do nível júnior até o cargo de diretor, a participação despenca progressivamente.

“A maior parte das iniciativas de diversidade é para negros como um todo, para garantir a entrada. A ideia é que, depois, essas pessoas evoluam dentro das empresas, mas isso ainda não aparece nas estatísticas’ Renan Batistela, do comitê de Diversidade do Vagas.com(foto: Reprodução/Vagas.com)

Negros só são maioria em posições operacionais e técnicas, enquanto a participação é reduzida em cargos de suporte, média e alta gestão. Para Renan Batistela, integrante do comitê de Diversidade & Inclusão e especialista em treinamento do Vagas.com, os dados comprovam racismo no mercado de trabalho.

Ele sente falta de mais programas específicos para inclusão na liderança. “A maior parte das iniciativas de diversidade é para negros como um todo, para garantir a entrada. A ideia é que, depois, essas pessoas evoluam dentro das empresas, mas isso ainda não aparece nas estatísticas”, afirma.

Para surtir efeito em posições de gestão, programas de inclusão devem garantir mais do que apenas o ingresso de pretos e pardos nas organizações: é preciso estabelecer medidas para que eles alcancem posições superiores. Segundo o levantamento, 47,6% dos negros estão em funções de nível auxiliar ou operacional, e apenas 0,7% são diretores.

“A impressão que fica é que essas pessoas entram, mas empacam nessas posições que deveriam ser de início e não conseguem evoluir”, diz Batistela. Cotas e objetivos de inclusão (definindo o percentual de posições de chefia a ser ocupado por negros até determinada data) podem ser ferramentas úteis.

“No entanto, esse tipo de ação só terá sentido em empresas que já estejam mais avançadas em diversidade. Como você vai estabelecer metas de liderança se não houver negros na base?”, questiona Batistela. Apesar de todos os desafios, uma boa notícia, segundo ele, é que cada vez mais empresas se abrem para o tema da diversidade.

Diferença no currículo

Além da discriminação, a maior dificuldade de acesso à educação é outro fator que impacta a ascensão para posições de chefia. No grupo estudado, 47% dos negros tinham nível superior, contra 55% dos brancos, 51% dos amarelos e 10% dos indígenas. Com relação à pós-graduação, os índices eram de 8,8%, 17%, 16% e 10%, respectivamente.

“Apesar de a diferença educacional não parecer significativa com relação ao nível superior, a disparidade é bem maior na pós-graduação: a quantidade de negros com essa formação é quase 50% menor que a de brancos”, afirma Renan Batistela, do Comitê de Diversidade do Vagas.com. Ele observa que as vagas para posições de liderança são as que mais exigem pós-graduações, como MBA.

De Eu Estudante